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Crescida na Inglaterra, Naomi Scott, como tantas jovens garotas, apaixonou-se quando bem nova pelas heroínas em animação da Disney – especialmente Mulan, Pocahontas e Jasmine de Aladdin. Mas enquanto essas três são oficialmente parte da franquia midiática e de brinquedos da Disney, ao lado de Cinderella, da Bela Adormecida, da Bela e da Ariel, não foram essas armadilhas ostensivas de princesinha que encantaram Scott. Foi algo mais profundo.

A Scott de 26 anos havia sequer nascido quando o “Aladdin” de 1992 chegou aos cinemas, um dentre a maré de êxitos que abasteceram a renascença animada dos anos 90 na Disney. Agora a atriz e cantora encontra-se trazendo vida tridimensional à personagem que uma vez ela brincou ser quando criança, imagens que incontáveis crianças tiveram coladas em suas paredes e cabeceiras. É muita coisa a desafiá-la.

“A Jasmine era a minha favorita, então eu não posso realmente conciliar essas duas coisas,” disse Scott. “Você precisa ter um saudável respeito com o que te antecedeu, mas eu continuo vendo essas coisas como distintas. É mais como um caso de ser capaz de criar essa versão humana dela. É assim que eu vi.”

Na verdade, a nova pegada de Scott para a Jasmine se destaca da versão original de maneiras que vão além de simplesmente a média narrativa. Enquanto que a Jasmine do filme original estava principalmente preocupada em escolher um esposo, a versão de Scott sonha em quebrar com as arcaicas tradições patriarcais e governar o seu reino de Agrabah. Essa é a Jasmine para a era de candidatas à presidência e o movimento #MeToo, refletindo amplas mudanças sociais em modelos de gênero e expectativas durante os últimos 27 anos.

Scott vê a evolução da personagem como um progresso natural. “Não parece como se estivéssemos colocando algo que não deveria ser colocado,” ela diz. “No filme original, por maior que seja o fato dela estar lutando pela escolha de com quem ela quer se casar, é aí que sua ambição meio que termina. Nesse filme, ela é mais ambiciosa e ela olha para fora de si. Ela está tentando proteger seu reino contra esse perverso ditador [Jafar]. Está mostrando que você pode liderar e você também pode ter romance. Vocês podem ter os dois, meninas, e os dois não são mutualmente exclusivos.”

Nos anos recentes, como a Disney tem procurado alavancar seu catálogo remanescente de animações com novas versões em live-actions, o estúdio descobriu que representações de papéis de gênero que eram aceitas nas décadas anteriores podem agora induzir arrepios. Mas imaginando como acertar a correta medida, fornecendo à audiência um conserto na nostalgia enquanto reflete o aumento da conscientização das questões de identidade e poder, está longe de ser fácil.

“Obviamente nós lidamos com gênero e como essas histórias têm mudado bastante com o tempo, seja ‘Cibderella,’ ‘A Bela e a Fera,’ ‘Aladdin’ ou ‘A Pequena Sereia,’ que estamos trabalhando agora’,” disse Sean Bailey, o presidente de produção da Disney. “Você teve algumas questões reais que você precisa se aprofundar e examinar por bastante tempo.”

Com o remake de Aladdin, essas questões surgiram no início do processo de desenvolvimento, como o diretor Guy Ritchie, o roteirista John August e o restante da equipe criativa buscava por meios de espanar alguma poeira da história e fazê-la mais alinhada com o dia a dia da audiência. “Nós assistimos ao filme original e falamos, ‘nos dias de hoje, isso parece fora de época?’ E há momentos de sábio relacionamento em que isso parece sim um pouco fora de seu tempo,” disse o produtor Dan Lin. “Sentimos como se tivéssemos uma real oportunidade de fazer a Jasmine ser uma líder feminina realmente forte nesse filme que talvez ela não fosse tanto no original.”

De acordo com um estudo de 2016 dos linguistas do Pritzker College e da Universidade Estadual da Carolina do Norte que analisava a separação do diálogo entre gêneros em numerosos filmes da Disney, personagens masculinos tinham 90% das falas no “Aladdin” original. (Muito dessa disparidade foi contabilizada pela famosa performance do Robin Williams como Gênio.)

Para ajudar a endireitar esse desequilíbrio e alimentar essa personagem poderosa que é a Jasmine, o compositor Alan Menken de “Aladdin”, em colaboração com a dupla de compositores Benj Pasek e Justin Paul, escreveram uma música para Scott performar, uma poderosa canção chamada “Speechless” na qual a Jasmine expressa seu desejo de libertar sua voz.

“Nós fomos muito inspirados por uma frase bastante misógena do filme original em que Jafar diz, ‘Você está calada, eu vejo. Uma boa qualidade em uma esposa,'” disse Pasek. “No mundo em que vivemos, tantas pessoas precisam libertar sua voz – ou clamá-la pela primeira vez – e ser sinceras sobre quem são e no que acreditam. Foi uma oportunidade emocionante de colocar essa mensagem na voz da Jasmine.”

Construindo a letra dessa música em meados de 2017 antes do escândalo da má conduta sexual de Harvey Einstein estourar, Pasek e Paul não poderiam prever como iriam ressoar com o espírito do momento. “A música foi escrita antes do movimento Time’s Up,” disse Paul. “Eu acho que é só confirmação de que existe uma antiga luta das pessoas que se sentiam marginalizadas e continuam a ser.” Ressaltando os perigos de reimaginar um querido clássico, o novo “Aladdin” enfrentou múltiplas críticas no caminho para as telonas. Após o lançamento do primeiro trailer, muitos apontaram defeitos no Gênio de Will Smith, enquanto outros reclamavam sobre o casting de Marwan Kenzari como o vilanesco Jafar, julgando o ator como bonito demais e não ameaçador o suficiente. A escolha de Scott como Jasmine não ficou livre de controvérsias também.

Apesar de Agrabah ser um país fictício, algumas pessoas usaram as redes sociais para rebaixar a decisão por Scott no elenco, argumentando que a atriz, que é descendente de uma gujarati indiana e um britânico, estaria pegando o papel que deveria ser dado a uma atriz árabe.

“Tantas atrizes árabes no planeta e eles contratam a meio-branca, meio-indiana Naomi Scott como Jasmine,” escreveu um usuário do Twitter. “A Índia não é árabe, Hollywood.”

Scott, provavelmente mais conhecida por espectadores americanos por seu papel no reboot de Power Rangers em 2017, diz que lidar com a pesada crítica que acompanha um projeto de alto escalão como “Aladdin” tem sido “uma boa curva de aprendizado.”

“Você só precisa estar confortável sabendo em si mesmo o que você está fazendo e não permitir que vozes externas alcancem essa parte,” ela diz, apontando para próprio coração. “Eu estou muito orgulhosa desse filme, de quão diverso é o nosso elenco, do que isso representa e da mensagem do filme. Todo mundo é intitulado à sua opinião. Eu não olhava tanto para a esquerda ou para a direita ou escutava o que as pessoas estavam dizendo. Você não pode entrar nesse costume, pode?”

Mesmo enquanto ela espera para ver o que a audiência fará com sua versão de Jasmine, Scott já está olhando adiante para outro papel que vai sair no final desse ano como uma das estrelas no reboot de As Panteras da Elizabeth Banks e cultivando uma carreira paralela como cantora-compositora. Não diferente de Jasmine, ela tem ambições que não serão sufocadas ou contidas. “Eu amo o despencar dos muros que alguém como Donald Glover faz,” Scott diz. “Eu definitivamente não sou alguém que deseja ficar numa caixa. Se você me colocar lá dentro, eu provavelmente romperei tudo de alguma forma. Então seria melhor apenas deixar-me livre.”


Fonte: Los Angeles Times
Tradução & Adaptação: Equipe Naomi Scott Brasil