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Quando Olivia Cooke começou a desenvolver Little Fish com o roteirista Mattson Tomlin, a meta deles era pegar uma premissa rebuscada e justificá-la em algo mais reconhecível. Ao invés disso, o gancho da história de ficção científica — uma pandemia de uma doença semelhante ao Alzheimer que causa rápida perda de memória — deu ao filme uma oportunidade acidental que a atriz de 27 anos, que também ocupa o cargo de produtora executiva, está tentando compreender. Cooke interpreta uma metade de um casal que está lutando para lidar com seu marido (Jack O’Connell) que é dominado pela doença. Para Cooke, que se estabeleceu na TV com sucessos como Me Earl and the Dying Girl e Thoroughbreds, o filme vem nos saltos de sua performance visceral no assustadoramente semelhante Sound of Metal, onde ela interpreta a cantora principal do grupo de rock pesado chamado Backgammon, cujo baterista (Riz Ahmed), com o qual ela está romanticamente envolvida, começa a perder sua audição. A seguir, a nativa de Manchester irá sair da curva do universo indie ao se preparar para gravar seu papel como Alicent Hightower, na prequel de Game of Thrones, a enormemente antecipada House of Dragons. Mas por hora, ela só está passeando na sua região em Londres, que é onde ela se associou com a sua amiga, a atriz Naomi Scott, com quem está começando um podcast para discutir, dentre outras coisas, os altos e baixos em ser uma atriz.

NAOMI SCOTT: Olivia Cooke, isso é divertido. As pessoas te chamam de Liv, Livvy, como é o esquema?

OLIVIA COOKE: Livie quando eu era criança. Meu primeiro nome no MSN era Livieyaxx. Eu era tão danadinha. E agora as pessoas só me chamam de Liv.

SCOTT: Eu tenho a sensação de que muitas pessoas não sabem que você é de Manchester, porque você está sempre fazendo um sotaque americano. As pessoas chegam em você e pensam que você é americana?

COOKE: Na América. Eu normalmente nunca sou reconhecida, mas quando eu sou é comumente por pessoas que pesquisaram um pouco. Mas os ingleses realmente não tendem a chegar em você.

SCOTT: Eles são muito esnobes. Na América eles ficam tipo, “Oh meu Deus,” enquanto que aqui, eles ficam “Eu sei quem você é, mas eu não vou falar porque eu sou muito orgulhoso.”

COOKE: Eu prefiro assim porque eu fico agoniada e envergonhada.

SCOTT: Eu consigo imaginar você sendo alguém que não se sente super confortável com isso. Você me faz pensar que você não é do tipo que se diverte com essa atenção. Estou certa?

COOKE: E quem se diverte?

SCOTT: Ah, tem alguns. Qual é.

COOKE: Você não me parece esse tipo de pessoa também.

SCOTT: Eu gosto de um momento com uma criança, o que é adorável, mas não, eu sou muito britânica nesse sentido também. Eu acho que somos provavelmente parecidas. Mas tem alguns atores que se divertem com essas coisas.

COOKE: Aí você começa a imaginar se eles estão lá pelas razões corretas.

SCOTT: Bom, essa já é outra conversa. Você sente falta de Manchester?

COOKE: Eu sinto falta da minha família, mas não de Manchester. Eu saí quando tinha 18 anos. Eu não conheço tanto assim de lá mais, e os anos que eu passei lá, meus anos de formatura, eu me sinto mortalmente envergonhada pelo meu comportamento de lá.

SCOTT: Como você era?

COOKE: Muito selvagem.

SCOTT: Quando você diz selvagem, do que estamos falando?

COOKE: Uma garota festeira. Identidade falsa, bronzeado falso, coisas assim.

SCOTT: O que você vestia?

COOKE: Um vestido tubinho.

SCOTT: Você não era uma garota de vestido tubinho.

COOKE: E saltos agulha, aos 16 anos. Isso é vergonhoso.

SCOTT: Isso é incrível. Eu vou precisar de provas fotográficas disso.

COOKE: E depois eu era uma boa garota, porque eu comecei a trabalhar. Agora eu achei de volta um pouco de diversão na minha vida, mas não de um jeito autodestrutivo.

SCOTT: Eu e meu marido estivemos jogando gamão. Esse é o máximo de agitação que chega durante essa quarentena. Toda noite nós olhamos um para o outro e ficamos tipo “Vamos jogar gamão?”

COOKE: É loucura, porque é como se a nossa juventude tivesse fugido um pouco.

SCOTT: Tem alguma coisa que você sempre quis fazer, mas sempre postergou, e que você planeja tentar fazer em breve?

COOKE: Viajar por conta própria. Eu viajei muito, mas é sempre a trabalho, o que não é tão divertido. Você é contratualmente obrigado a não se meter em encrenca, então não esquie, não faça rafting, não faça nada que tenha a possibilidade de você quebrar um osso.

SCOTT: Eu estou nos meus 27 anos, onde eu começo a entender o que me gravitaciona ao redor de um projeto. Eu sempre admirei as suas escolhas, mas como eu estou interessada nos seus processos, como você decide aceitar um papel, seja isso lutar por ele ou aceitar um que lhe foi oferecido?

COOKE: Essa é uma pergunta muito boa à qual eu não sei a resposta. É mais instintivo e profundo. Eu acho difícil de intelectualizar como eu me sinto sobre os projetos, especialmente quando eu estou falando com os agentes e os gerentes sobre a razão de eu não querer realizá-los. A escrita precisa ser excepcionalmente boa, e eu sempre busco pelo passado das pessoas envolvidas, porque se eu ouvir de muitas pessoas que alguém é um idiota, bem, a vida é muito curta.

SCOTT: A vida é muito curta.

COOKE: Eu costumava pensar que fazer um projeto era como a Terra do Nunca. Você poderia deixar a sua própria realidade para trás por alguns meses. Mas eu percebi que eu provavelmente continuarei fazendo isso por muito tempo, então a minha vida tem que ser abrangente nessa área. Eu não posso simplesmente compartimentalizar o trabalho e a minha vida, então eu tenho que sentar e pensar, “Essa experiência inteira é benéfica para a minha vida, e o que eu quero dizer sobre o mundo no geral? Isso é algo pelo qual eu quero me doar?”

SCOTT: Eu sou que nem você. Eu quero doar a energia e o sangue, o suor, e as lágrimas que isso exige, e eu quero colocar isso para o mundo? Eu acredito no que está sendo dito? Eu acredito no vislumbre, seja do diretor ou do roteirista? É mais ou menos onde eu estou agora. Em termos de Sound of Metal, como que isso veio à tona?

COOKE: Isso veio à tona porque a outra atriz deixou o papel. Eu sou o rei em preencher o espaço.

SCOTT: Essa é literalmente a minha vida. É assim que funciona, bebês.

COOKE: Mesmo que me ofereçam um trabalho em primeira mão, eu fico “Eles provavelmente queriam a Emma Watson.”

SCOTT: [Gargalha]

COOKE: Meu agente me ligou meio ansioso, e falou, “Eu quero que você conheça o diretor [Darius Marder] amanhã, porque eu achei o roteiro incrível.” Eu voei de volta de L.A. para Nova Iorque para conhecê-lo, e eu li o roteiro no avião. Ele não só explorava uma cultura para a qual eu era tão ignorante, mas explora a codependência e o vício e isso é realmente sincero, de um jeito matizado. Eu estava chorando tanto que a aeromoça passou e me entregou um pedaço de chocolate. Eu conheci o Darius no dia seguinte, e eu tive uma pequena ressaca emocional do dia anterior, então eu só falei muito sobre como eu amei o roteiro. Eu provavelmente o agradei porque uma semana depois ele me ofertou o emprego.

SCOTT: Era tudo o que você precisava, e você precisou fazer muito… como é o nome, aquele tipo de cantar gritando?

COOKE: Gritar. A pessoa que me ensinou a gritar, Margaret Chardiet da banda Pharmakon, é o verdadeiro sucesso. Ela tem esse som industrial bem bacana e é uma gritadora. Ela me levou a um estúdio em Bushwick, e ficava, “Grita agora.” Era tão vergonhoso, e aí ela ficou, “Eu vou fazer isso com você.” E então estávamos gritando juntas nessa célula acolchoada.

SCOTT: Eu sei que existe uma certa técnica no metal para não destruir a sua voz.

COOKE: Eu fiquei sem voz, mas era uma questão de honra.

SCOTT: E é claro que a estrela do filme foi a sua sobrancelha.

COOKE: É tão engraçado, a infâmia que essas sobrancelhas receberam porque eu realmente achei que estava tão foda com elas.

SCOTT: Eu sinto como se você estivesse na capa de i-D pela primeira parte do filme. Eu não pude assistir Little Fish porque não está disponível por aqui, mas é sobre uma pandemia, o que é estranho. Vocês gravaram antes da nossa pandemia?

COOKE: Nós gravamos nove meses antes de sequer sabermos da existência do coronavírus. Eu tinha lido a história escrita pela Aja Gabel, nós compramos os direitos exclusivos, e eu e o escritor Mattson [Tomlin] estivemos trabalhando nele por dois anos antes de filmarmos, e estávamos tipo, “Isso é tão ficção científica, você consegue imaginar se alguma coisa assim acontecesse?”

SCOTT: Como foi esse processo em termos de trabalhar no projeto e descobrir como que seria como um filme?

COOKE: A escrita da Aja é tão melancólica e cinemática. A história dela retratou esse jovem casal num relacionamento tão puro, que faz o partir dos corações ser ainda mais puro quando o relacionamento começa a desmoronar porque um deles está esquecendo do outro. Não houve fraude, não houve traição, nenhum deles se desiludiu sobre os sentimentos com a outra pessoa. É só que um está começando a esquecer o outro, o que é mais comum de ver em casais mais velhos, então o fato de serem duas pessoas novas é como uma vida encurtada, de certo modo. Nós tentamos manter isso no roteiro que também tem que construir um mundo sem que esse seja muito fantasioso.

SCOTT: É como [o filme do Drake Doremus] Equals. Tem o elemento da ficção científica, mas é bem mais fundamentado. Os humanos permanecem os mesmos, independente do contexto em que você os insira.

COOKE: Nós vimos nesse último ano quão adaptáveis nós somos.

SCOTT: Eu estava no set e o elenco senta com aquelas coisas grandes de plástico em cada lado, escudos completos, e eu estava falando com uma das atrizes sobre como nós nos adaptamos tão rápido. Nós ficamos tipo, “Ah, esse é o novo normal.” Ela estava contando que uma pessoa que ela conhecia voltou para as gravações na Austrália, onde está perto da normalidade, e eles na verdade tiveram que se adaptar àquilo. Mas quão abençoadas somos por estarmos trabalhando?

COOKE: Eu sei. Eu penso nisso o tempo todo. Eu também me sinto um pouco culpada por isso.

SCOTT: Sobre o que você tem assistido, tem algo no qual você tem gravitado durante a pandemia? Por exemplo, eu maratonei Ted Lasso. Não sei se você já viu.

COOKE: Não vi.

SCOTT: É o seguinte: se você tem um lado cínico e esnobe, que eu acho que todos temos, você tem que ver. É incrivelmente puro e é como um remédio para a alma.

COOKE: Eu terminar outra série da Apple TV chamada Long Way Up com Charley Boorman e Ewan McGregor. Eles estão numa viagem pesada de bicicleta, da ponta da América do Sul, pela América Central e até Los Angeles, e é esse desejo de viajar que eu estive ansiando tanto. Eles também são homens muito charmosos atuando para a UNICEF, e eles também estão em bicicletas elétricas para avisar que eles estão tentando ser conscientes sobre o meio-ambiente. Eles estão tendo o melhor dos momentos, falando merda um com o outro. Esse senso de amizade e de ir mundo afora é algo que eu sinto muitas saudades. Eu escutei que Ted Lasso se saiu muito bem, né? Todo mundo ama.

SCOTT: Cara, assiste.

COOKE: Eu não tenho mais nada pra fazer.

SCOTT: Eu posso ser muito esnobe quando o assunto é sobre séries. Quando você assiste algo como Succession, você acha que tudo tem que estar naqueles padrões. Você esquece que existem diferentes séries para diferentes momentos e estados de espírito.

COOKE: Eu tenho ido para a cama assistindo The Vicar of Dibley.

SCOTT: Eu amo The Vicar of Dibley.

COOKE: Você assistiu recentemente?

SCOTT: Não.

COOKE: É legal revisitar. É como entrar em uma banheira de galões de chocolate.

SCOTT: Sabe o que mais eu estive fazendo? Além de usar a minha smart TV, eu estive assistindo TV a cabo, tipo BBC 1 ou BBC 2. Tem algo que me traz de volta à minha infância.

COOKE: Eu sei o que você quer dizer. É como se sentir unido ao restante da nação, tipo você sabe o que está sendo colocado nas telas de outras pessoas. Eu sei que a minha mãe está assistindo a mesma coisa em Manchester. GoggleBox também me manteve bem.

SCOTT: GoggleBox é o melhor. Quem é o seu personagem favorito? Eu sei quem é o meu.

COOKE: Eu amo os Siddiquis. Eu amo o pai. Eu amo o Giles e a Mary.

SCOTT: Eles são os meus favoritos, sem dúvidas. Eles são geniais. Tem algo de tão reconfortante nesse reality. A Interview me entregou algumas perguntas, então eu vou lê-las palavra por palavra. “Diga-nos tudo o que puder sobre House of Dragons sem comprometer seu trabalho.”

COOKE: Eu acho que eu não posso falar nada.

SCOTT: Fantástico, seguindo em frente. Durante a quarentena, eu achei o processo de audição bem divertido. Tem sido o meu escape criativo. É como, “Ah, eu posso atuar outra vez,” porque eu não pude estar em set. O que você tem achado das audições na quarentena, e qual é o seu relacionamento com o self-tape (gravação autônoma do teste de elenco), porque sendo do Reino Unido a minha carreira inteira tem sido com self-tape.

COOKE: Tem sido tudo bem, na verdade. Os prós de fazer self-tape é que você pode tentar quantas vezes quiser. Os contras são que você pode se sufocar em suas próprias neuroses. Você fica tentando se pontuar e focar em algo que ninguém mais vai perceber. Tendo estado do outro lado, você realmente só precisa de 30 segundos de self-tape. Ajudando os colegas que estão fazendo self-tapes e vendo a pressão que colocam sobre si, eu só quero dizer: não o faça. Só se divirta com isso. Você estará certo em algumas coisas mas você não estará certo na maioria delas, então pegue cada self-tape com uma pitada de sal. Não vale a pena arrancar os cabelos por isso.

SCOTT: Você está tão certa. Quanto mais eu entendo o outro lado disso, mais eu entendo quão pouco tem a ver com você. São tantas razões, mas ao invés de focar nisso, aproveite o processo de interpretar outro personagem e aprender alguns lados. Mas eu acho que você está certa quando você diz que podemos nos atracar nas coisas pequenas, porque você está se assistindo. Quando você está numa sala, é mais uma questão de energia, se você tem aquilo que eles procuram. Se conseguiu dizer as falas perfeitamente, nunca é sobre isso.

COOKE: E também, quando você está numa sala, você tem o bônus de ter química com as pessoas, mas na maioria das vezes você está tentando forjar uma ligação entre você e o diretor, e você está em desvantagem se estiver lendo para uma voz sem corpo.

SCOTT: Na verdade eu gravo as minhas. Eu amo o meu marido, mas deixa eu te falar. Quando é para ler comigo, ele é monótono. Então eu tenho que gravar minhas próprias falas no Logi.

COOKE: Meu amigo faz isso, mesmo que todos os amigos dele sejam atores, mas ele prefere assim. Ele se sente menos envergonhado, como se estivesse no tempo dele. Você gosta disso, mesmo se você tem a opção de fazer com um ator?

SCOTT: Eu não tenho muitos amigos atores, na verdade, então eu acho que faz parte, mas mesmo se tivesse eu preferiria fazer por mim mesma. Pode soar meio narcisista mas é mais uma questão de controle.

COOKE: Às vezes os diretores de elenco e os diretores são cruéis e pedem para você fazer uma cena de um verdadeiro colapso emocional, e às vezes você fica, “Eu realmente não quero fazer isso na frente do meu amigo.” Ou do seu marido.


Fonte: Interview Magazine
Tradução & Adaptação: Equipe Naomi Scott Brasil